A nova realidade de El Salvador: presidente controla todos os poderes

Por Rogerio Magno em 04/05/2021 às 10:16:51
Entenda como o Legislativo dominado por Nayib Bukele invocou a pandemia para destituir juízes do Supremo e procurador-geral. Protesto em San Salvador, em El Salvador, contra a destituição de cinco juízes da Suprema Corte, em 2 de maio de 2021

Jose Cabezas/Reuters

A destituição de cinco juízes do Supremo Tribunal de Justiça e do procurador-geral de El Salvador no primeiro ato da Assembleia Nacional dominada pelo partido do governo deu ao presidente Nayib Bukele o que lhe faltava para consolidar o poder: o controle da Justiça. Juntou também EUA, União Europeia, OEA e boa parte da comunidade internacional em um consenso — o de que ele promoveu um ataque totalitário contra a democracia.

Os magistrados, seus suplentes e o procurador-geral foram substituídos por outros alinhados ao presidente mais jovem que o país já teve. Com 39 anos, o carismático Bukele é considerado o dirigente mais popular da América Latina, a despeito dos traços autoritários que o caracterizam e assustam os ativistas de direitos humanos.

Seu prestígio entre os salvadorenhos supera a marca dos 90% e se mantém intacto. Isso se explica muito pelo cansaço e pela rejeição popular aos dois partidos que em três décadas alternaram o comando do país desde o fim da Guerra Civil -- o esquerdista Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN) e o direitista Aliança Nacional Republicana (Arena).

A ascensão da conservadora Grande Aliança pela Unidade Nacional (GANA), de Bukele, em 2019, praticamente esfacelou o bipartidarismo em El Salvador. Com estilo informal, ele tem por hábito governar pelas redes sociais, estabelecendo um canal direto com sua base.

Por estas plataformas, impõe decretos, demite auxiliares e manda recados, como fez aos que o criticaram, após a destituição dos juízes do Supremo: “Aos nossos amigos da comunidade internacional: queremos trabalhar com vocês. Mas, com todo o respeito, estamos limpando a nossa casa… e isso não é da sua competência.”

A remoção de um terço dos magistrados que integram o tribunal tem na pandemia do novo coronavírus o seu principal pretexto, evidenciando também a motivação política da controversa iniciativa. Num ato sumário, deputados do Novas Ideias argumentaram que os juízes atrapalham a estratégia do governo para conter a Covid-19, ao decidir que o Executivo não tinha autoridade para prender quem desrespeitasse os rígidos controles impostos pela quarentena.

Embora por motivos opostos, uma rara manifestação de apoio à remoção de juízes veio justamente do Brasil. Foi aplaudida pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente Jair Bolsonaro, crítico contumaz do lockdown para coibir os efeitos da pandemia.

Os parlamentares salvadorenhos se baseiam no artigo 186 da Constituição, que prevê a destituição de magistrados, se aprovada por dois terços do Legislativo. A maioria governista de 64 dos 84 deputados não teve a menor dificuldade para respaldar rapidamente a medida, no sábado, logo após a posse da nova Assembleia. O procurador-geral Raúl Melara foi removido do cargo por supostos laços com o partido opositor Arena.

“Bukele ataca o Estado de Direito para concentrar todo o poder em suas mãos”, resumiu José Miguel Vivanco, diretor para as Américas da ONG Human Rights Watch. Mais de 20 entidades civis salvadorenhas rechaçaram a decisão do Parlamento, rotulando-a como um golpe de Estado técnico. Especula-se que Bukele vá estender o controle a outros órgãos do Judiciário.

Escoltados por guardas armados, os cinco novos juízes e o novo procurador-geral assumiram suas funções e posaram para a foto oficial, denotando também a nova realidade em El Salvador: a de que os poderes do Estado estão sob o domínio de Nayib Bukele.

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Fonte: G1

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