Um ano sem Maradona: as polêmicas que mantêm o mito do futebol vivo na memória

Por Rogerio Magno em 25/11/2021 às 19:27:29
Vida do craque é tema de nova série da Amazon, enquanto investigações na Justiça argentina apuram circunstâncias de sua morte e denúncias de abuso e maus tratos de ex-namorada. Ex-atleta é considerado uma das maiores estrelas do futebol mundial

Getty via BBC

Um ano depois de sua morte, Diego Maradona continua a ser notícia.

As mais recentes giram em torno das denúncias de supostos abusos e maus tratos que teriam sido cometidos por ele contra uma ex-namorada, a cubana Mavys Álvarez, que teve um relacionamento com o ex-jogador de futebol quando ela ainda era menor de idade.

O caso está sendo investigado pela Justiça argentina, assim como as circunstâncias da morte de Maradona em sua casa, em 25 de novembro do ano passado.

O inquérito para definir os responsáveis já gerou processos contra sete pessoas, incluindo seu médico, seu psiquiatra e sua psicóloga.

Ao mesmo tempo, nos últimos dias, a imagem do ex-capitão da seleção argentina está espalhada por toda Buenos Aires.

Os cartazes fazem propaganda de uma nova série do serviço de streaming da Amazon, Maradona, a conquista de um sonho.

Ao recontar a vida - e as polêmicas - do jogador, o programa contribui para manter vivo o mito em torno de uma das personalidades mais admiradas e criticadas da Argentina.

'Vida cheia de tragédias e amor'

É como escreveu o escritor peruano Mario Vargas Llosa: "as séries são hoje o equivalente às novelas" que geravam furor no passado.

Mas a pitada a mais destas séries é que elas são, nos casos de Maradona e outros personagens latino-americanos bastante populares, baseadas em fatos reais e nos seus momentos de glória e de decadência.

O diretor argentino Alejandro Aimetta, que dirigiu a série da Amazon sobre o ex-jogador argentino, diz que "a vida é cheia de tragédias e de amor".

Ao retratar a trajetória de pessoas que poderiam ter tido uma vida comum e que de alguma forma se destacaram, isso"nos lembra de que tudo é possível".

Para o diretor, a realidade pode muitas vezes superar a ficção, e o espectador se vê muitas vezes espelhado em momentos da vida de seu ídolo.

"Apesar das dificuldades, personagens como Maradona mostram que vale a pena se atrever. Alguns foram bem na vida e outros, não. Mas, no fim das contas, todos queremos que nos amem", diz Aimetta à BBC News Brasil.

Velório

A sociedade, avalia o diretor, espera que "seus heróis" construam suas próprias "expectativas e esperanças", mas quando eles estão por baixo, esse sentimento volátil também pode mudar em relação ao personagem real.

Foi o que aconteceu com Maradona, quando já estava doente e prestes a morrer, sugere Aimetta.

O velório reuniu, porém, uma multidão nos arredores da Casa Rosada.

Na confusão, naquele dia de forte calor, o presidente da Argentina, Alberto Fernández, usou um megafone para pedir calma aos fãs do ex-jogador.

Na confusão, o corpo de Maradona foi retirado pelos fundos rumo ao cemitério, já que, como contou um dirigente de um clube de futebol, sob a condição do anonimato, o plano de parte da torcida era "sequestrar o caixão e levá-lo para algum estádio, onde mais gente pudesse vê-lo na despedida".

Aimetta prefere não revelar se as cenas do velório, com repressão policial e correrias, também farão parte das novas temporadas da série.

Futebol, drogas e escândalos

A produção da série, meses antes da morte de Maradona, incluiu dez entrevistas com o craque.

Seu depoimento ajudou no desenvolvimento dos personagens e no retrato de sua infância pobre, quando já mostrava sua devoção pelo futebol, de sua juventude nos campos e de sua vida adulta, com o envolvimento com drogas e escândalos.

A série começou a ser filmada em 2019, na Argentina, na Espanha, na Itália, no Uruguai e no México.

O roteiro foi redigido também a partir de entrevistas com pessoas ligadas a Maradona, diz o diretor.

"Não sabemos se ele viu. Nós fomos enviando para ele os capítulos que íamos terminando, mas não sei se ele chegou a vê-los", afirma Aimetta.

Pelé e 'pouca roupa'

Desde a estreia da série, no início do mês, cada capítulo rendeu comentários e polêmicas.

Como a adaptação do encontro entre Maradona e Pelé que, na ficção, incluiu "mulheres com pouca roupa e uma delas de topless", segundo a resenha, em tom crítico, do jornal La Nación.

"Inventar essa versão (do encontro) é uma loucura total e uma falta de respeito com a família de Pelé ", teriam dito pessoas próximas dos que participaram do encontro, realizado em 1979, no Rio de Janeiro, segundo publicou o jornal argentino.

"Era algo para contar a partir de poucas cenas, que foi o contato entre estes dois ídolos e tinha relação também com um choque cultural e as diferenças entre os dois países", diz Aimetta à BBC News Brasil.

Para Aimetta, não houve ofensa na cena na série que definiu como sendo "biográfica e, ao mesmo tempo, ficcional".

O escritor cubano Marcial Gala dizia que "uma boa série deve resultar tão controversa quanto um bom romance".

No caso de Maradona, séries podem reforçar a ideia de que um ídolo é "um grande homem, apesar de certas baixarias e mediocridades", diz Aimetta.

Nas rodas de conversa na Argentina e no Uruguai, essa relação de, digamos, "amor e repulsa" é notória.

Há quem não perdeu um capítulo sequer da série e entendem seus momentos difíceis. Já outros dizem "não vi e não gostei".

Altos e baixos

Maradona não é a única personalidade latino-americana que teve sua vida retratada nas telas em meio a polêmicas.

Há poucos dias, a terceira temporada da série sobre o cantor mexicano Luis Miguel gerou controvérsias e levou o artista a escrever em suas redes sociais que "a série da Netflix é ficção". "Não é 100% verdade", declarou.

Em uma entrevista recente à Dalma Maradona, uma das filhas de Maradona, em um programa de rádio, o ator mexicano Diego Boneta, que interpreta Luis Miguel, disse que o cantor e o ex-jogador compartilham "certas semelhanças".

Dalma complementou destacando a "loucura que provocaram (entre os fãs)".

Boneta disse que esta é a temporada "mais ousada e arriscada" sobre a vida do cantor.

"Esta temporada aborda um Luis Miguel em seu melhor momento, mas também em seu momento mais complicado, o que a torna muito interessante", disse.

Outro com uma vida bastante controversa foi o traficante Pablo Escobar, tema de séries na Netflix (Narcos, com Wagner Moura, e Patrón del Mal) e que, como Maradona e Luis Miguel, já rendeu vários livros.

Autora do livro Amando Pablo, odiando Escobar, a apresentadora colombiana de televisão Virginia Vallejo costuma explicar a diferença, em sua visão, sobre Escobar, de quem foi amante.

Ela lembra que, quando o conheceu, ele ajudava os bairros pobres de Medellín, até que passou a mandar matar autoridades do país, tornando-se um símbolo da criminalidade na Colômbia.

O historiador e dramaturgo venezuelano Luis Britto García diz que um ídolo (para o bem ou para o mal) não tem uma trajetória simples, mas, principalmente "mobiliza sentimentos".

Neste sentido, talvez tenha existido poucos ídolos como Diego Maradona.

Fonte: G1

Comunicar erro
Rede Ideal 1

Comentários

Telecab