É necessĂĄrio apenas que as escolas preencham um formulĂĄrio para poderem passar 'A Tradicional FamĂlia Brasileira – Katu'. Ideia é levar mais tĂtulos ao ambiente educacional. Projeto leva filme sobre os povos indĂgenas potiguares para o ambiente escolar
Burnno Martins/Divulgação
O projeto Cinema em Debate abriu inscrições para que escolas do Rio Grande do Norte tenham acesso e exibam o filme potiguar "A Tradicional FamĂlia Brasileira – Katu". Além de assistir à obra, os alunos das escolas interessadas terão um bate-papo gravado com os realizadores da produção e o protagonista.
O objetivo da iniciativa é provocar uma reflexão sobre a existĂȘncia e a sobrevivĂȘncia dos povos indĂgenas no Rio Grande do Norte e despertar o interesse pela arte cinematogrĂĄfica produzida no estado.
As instituições de ensino interessadas devem acessar o formulĂĄrio e preencher as informações. Feito isso, o acesso ao conteĂșdo jĂĄ estarĂĄ disponĂvel.
O filme "A Tradicional FamĂlia Brasileira – KATU" tem roteiro e direção do fotógrafo Rodrigo Sena, e foi finalizado em janeiro de 2019. Ele parte de um ensaio fotogrĂĄfico produzido no ano de 2007 em reconhecimento aos povos originĂĄrios Potiguaras, retratando doze adolescentes pertencentes ao Eleutério do Katu, no RN.
Doze anos depois, o fotógrafo voltou ao Katu em busca desses protagonistas, hoje jĂĄ adultos, para saber sobre suas trajetórias pessoais e suas visões de mundo. O diretor destaca a importância de levar o debate sobre o universo audiovisual e o povo indĂgena para o ambiente escolar.
"No processo de desenvolvimento do filme, percebemos uma oportunidade de entendimento dos indĂgenas diferente do ponto de vista atual da sociedade mas contado pelos próprios Potiguaras do RN. Constatamos também, neste processo, o quanto somos impregnados de forma inconsciente pela percepção ancestral distorcida da identidade indĂgena", diz o diretor.
Cinema em Debate
Rodrigo Sena diz também que o Cinema em Debate terĂĄ continuidade com outros tĂtulos. "O projeto traz para a sala de aula a possibilidade do debate através do cinema, numa tentativa de dar voz à resistĂȘncia de um povo oprimido que sofreu diversas violĂȘncias e ainda hoje continua resistindo, seja pela ameaça constante do agronegócio como também pelas ações de evangelização na aldeia", pontua.
"Acompanhando o avanço do audiovisual potiguar, o projeto começa com a exibição do filme 'A Tradicional FamĂlia Brasileira - Katu', mas continuarĂĄ com outros tĂtulos de filmes que trazem possibilidades de valorização e reflexão por meio dos seus diversos conteĂșdos".
O cacique Luiz Katu, da comunidade indĂgena de Katu dos Eleotérios, relata a importância para o povo indĂgena de ter a sua voz ampliada pelo filme e pelo projeto.
"Participar das gravações desse filme e do projeto Cinema Debate para nós indĂgenas do RN, em especial para nós indĂgenas da aldeia Katu, tem sido um motivo de luta reforçado. A gente tem uma construção na luta da quebra da invisibilidade e consegue chegar em vĂĄrios espaços, vĂĄrios lares, chegar em locais de pessoas que nem imaginariam a nossa existĂȘncia, a nossa resistĂȘncia. Resistir para existir", diz.
O cacique relata, ainda, a importância das pessoas conhecerem a realidade e a resistĂȘncia dos povos indĂgenas da aldeia Katu e do estado do Rio Grande do Norte.
"Nós estamos engajados nessa luta para quebrar a invisibilidade, quebrar os estereótipos, os preconceitos, a forma como as pessoas veem os indĂgenas, como se eles estivessem estagnados em 1500. E 'A Tradicional FamĂlia Brasileira - Katu' mostra uma realidade de um povo que luta para viver, que tem seus afazeres no seu dia a dia, mas que o seu sangue, a sua cultura e as suas memórias permanecem, e isso é realidade no filme", diz.
"E o Cinema Debate traz à tona esse questionamento, essa reflexão, essa provocação para todos aqueles que possam interagir por meio dessa ação que é de suma importância. Refletir, fazer uma releitura do que estĂĄ posto e questionar a historiografia oficial, esse é o grande propósito. Espero que o projeto alcance o seu pĂșblico-alvo que são os professores, alunos e o também o pĂșblico em geral".
O filme
O filme narra um recorte do desdobramento da vida dos jovens do povoado do Eleotério do Katu, localizado entre os municĂpios de Canguaretama e Goianinha - que possui a Ășnica escola indĂgena do RN. Através deles, a obra aborda histórias coletivas abrangentes, que transpassam suas trajetórias individuais na comunidade indĂgena, ressaltando a questão da herança cultural e étnica desses povos.
A tradicional FamĂlia Brasil - Katu, filme potiguar RN de Rodrigo Sena
Divulgação/Trailer
A intenção do filme é valorizar as narrativas orais e as memórias dos excluĂdos, trazendo maior luz à reconstrução da história marginal dessas comunidades. O que se pretende é compreender como tem sido a reconstrução social e sobrevivĂȘncia dos povos indĂgenas no RN.
Idealização
Segundo os idealizadores, por muito tempo, a sobrevivĂȘncia de comunidades indĂgenas em terras potiguares não foi devidamente registrada. Segundo parte da historiografia documental e dados da Fundação Nacional do Ăndio (FUNAI), estados como o RN não apresentariam comunidades indĂgenas nos dias atuais, pois elas teriam sido dizimadas em epidemias e guerras de extermĂnio ainda no perĂodo colonial.
Além disso, historiadores apontavam o "desaparecimento étnico" dessas populações em virtude da mestiçagem dos Ăndios com outros grupos locais, que teriam sido reconfigurados como "caboclos" e "pardos".
Essa ideia prevaleceu em quase todo o século XX e, somente na década de 1990, a presença indĂgena voltou a ser consignada no estado, fruto de um reavivamento polĂtico em torno do reconhecimento de sua identidade e da posse de suas terras.
Esse movimento ganhou força por volta de 2005, quando pesquisadores integrados a instituições pĂșblicas, museus e universidades passaram a visitar e entrevistar comunidades residentes no interior do estado, que se engajaram em movimentos de autoafirmação dos povos indĂgenas.
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