Conheça os envolvidos na crise com o avião da Ryanair forçado a pousar na Belarus e por que o caso virou uma disputa diplomática

Por Rogerio Magno em 24/05/2021 às 13:08:01
Alexander Lukashenko forçou um avião que sobrevoava o espaço aéreo bielorrusso a pousar para prender jornalista Roman Protasevich, crítico do seu regime. Avião da Ryanair que foi desviado para pousar na Belarus para que um passageiro fosse preso

AFP

Um avião da Ryanair que havia partido da Grécia com destino a Lituânia recebeu um aviso de bomba dos controladores de voo da Belarus neste domingo (23).

Assim que a aeronave entrou no espaço aéreo da Belarus, caças acompanharam o avião que levava cerca de 170 passageiros.

Belarus é acusada de sequestrar voo para prender opositor

Não havia bomba nenhuma: o aviso era só uma manobra para que o avião pousasse no aeroporto de Minsk, onde foi preso um dos passageiros, um bielorruso de 26 anos que envia textos de oposição ao regime do líder autoritário da Belarus, Alexander Lukashenko, em canais de Telegram.

O passageiro, Roman Protasevich, é também acusado de organizar passeatas contra Lukashenko.

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Guilherme Pinheiro/Arte/G1

O caso tem sido interpretado como um sequestro feito por um Estado. Os países da União Europeia, os Estados Unidos, a agência da ONU responsável por aviação, a Associação Internacional de Transporte Aéreo e as companhias aéreas verbalizaram sua indignação com o caso.

A Rússia defendeu a Belarus. O governo da Belarus disse que os controladores de voo só fizeram uma sugestão aos pilotos.

Veja abaixo quem são os principais envolvidos no caso e por que o incidente abriu uma crise diplomática e da aviação civil.

Quem é Alexander Lukashenko, o líder da Belarus?

Lukashenko é o líder autoritário da Belarus. Ele começou a carreira como diretor de uma fazenda coletiva. Em 1994, pouco após o fim da União Soviética, ele tomou o poder no país.

Ele é chamado de “o último ditador da Europa”.

Em 23 de agosto de 2020, presidente da Belarus, Alexander Lukashenko, apareceu em público armado com um rifle perto do Palácio da Independência em Minsk

State TV and Radio Company of Belarus via AP

O país chega a realizar eleições, mas os resultados indicam que há problemas nos pleitos. Em 2015, ele teve 83,5% dos votos. Em 2020, ele teve 80% dos votos.

No ano passado, após a divulgação dos resultados, os bielorussos começaram a protestar. Durante cerca de três meses houve protestos nas cidades do país em que diziam que a eleição havia sido fraudada.

No país há uma agência de segurança interna que ainda tem o nome de KGB, da era soviética.

Os espiões são chamados de “curadores”. Eles estão presentes em escolas, empresas e em diferentes órgãos do governo.

Os agentes escutam conversas de dirigentes do governo, juntam material comprometedor de opositores ou de qualquer um suspeito de não ser leal a Lukashenko.

Quem é o opositor que Lukashenko queria prender?

Roman Protasevich é o fundador de um canal em redes sociais chamado Nexta. Ele enviava textos pelo aplicativo Telegram, que virou uma forma que os opositores de Lukashenko encontraram para se organizar e compartilhar informação. Na Belarus, há poucos canais de mídia com independência editorial —alguns foram fechados após a cobertura dos protestos do ano passado.

Roman Protasevich em foto de 10 de abril de 2017, quando chegava para prestar depoimento em Minsk

Stringer/Reuters

Já na adolescência, Protasevich se tornou um opositor e passou a ser investigado pela agência de segurança. Ele foi expulso de uma escola em 2011, por participar de uma manifestação. Depois ele foi expulso do curso de jornalismo em Minsk.

Em 2019, com medo de ser preso, Protasevich saiu do país, de acordo com uma reportagem do “New York Times”. Ele foi morar na Lituânia.

Qual é o crime em que pode ser enquadrado?

Mesmo fora do país, em novembro do ano passado ele foi acusado de incitar a desordem pública e o ódio social. As penas previstas para esses crimes podem passar de 12 anos de prisão.

A KGB considera que Protasevich é um terrorista. Se ele for acusado e condenado por terrorismo, ele pode até mesmo ser executado pelo Estado.

Por que o caso se tornou uma crise diplomática?

Países da Europa e os Estados Unidos já manifestaram sua insatisfação com o caso.

Avião da Ryanair que teve a rota desviada para pousar em Minsk, onde um opositor do governo da Belarus foi preso

Andrius Sytas/Reuters

A expectativa é que a agência de aviação civil da Europa dê uma orientação. A agência (Easa, na sigla em inglês) recomendou cautela a quem for usar o espaço aéreo da Belarus.

A Belarus ganha cerca de US$ 500 por cada avião que atravessa seu espaço aéreo.

A organização da ONU para aviação civil (Icao, na sigla em inglês) afirmou que o incidente é uma quebra de um dos principais tratados criados após a Segunda Guerra.

Pelas regras da aviação civil, nem a Icao nem qualquer país podem fechar o espaço aéreo de um outro país. No entanto, os governos podem dizer às suas companhias aéreas que devem evitar sobrevoar um território.

Os EUA pediram um encontro da Icao, que tem poder para investigar questões como essa.

As companhias aéreas e a União Europeia pediram uma investigação.

A Belarus disse, nesta segunda-feira, que os controladores de voo só deram recomendações aos pilotos da Ryanair.

A Rússia acusou os países do Ocidente de hipocrisia. Os russos citaram dois incidentes

Em 2013, o avião presidencial da Bolívia foi obrigado a pousar na Áustria porque a agência de inteligência dos EUA suspeitava que o presidente da época, Evo Morales, levava ex-analista da Agência Nacional de Segurança americana (NSA, na sigla em inglês), Edward Snowden, que havia vazado dados sensíveis do governo americano.

Em 2016, um avião da Belarus foi obrigado a pousar na Ucrânia —a empresa aérea tinha desentendimentos financeiros com a Ucrânia.

O caso pode representar uma crise para a aviação civil?

Algumas linhas aéreas já passaram a evitar o espaço aéreo da Belarus, que é um corredor entre a Europa Ocidental e a Rússia (algumas rotas para a Ásia também passam pela Rússia).

Uma empresa aérea, a airBaltic, decidiu não usar o espaço aéreo da Belarus “até que a situação fique clara”.

O site Flightradar24 mostra que ao menos um voo da Ryanair evitou sobrevoar o país.

A Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata, na sigla em inglês) condenou a interferência e disse que a ação da Belarus é incompatível com a lei internacional. A Iata pediu uma investigação internacional, mas ainda não é claro quem iria conduzir isso.

Não há um órgão internacional que tem poder para decidir disputas sobre soberania em aviação.

A Icao, por exemplo, não tem poder para estabelecer regras, mas faz parte de um sistema sobre padrões de segurança.

A Icao foi mais atuante nos anos 1980, quando era comum que grupos militantes ou terroristas sequestrassem aviões —a discussão, na época, era se os países deveriam ou não permitir que aviões pousassem.

Essa seria a primeira vez que a Icao faria uma avaliação sobre um de seus membros forçar um avião a pousar.

Fonte: G1

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