Grupo internacional de direitos humanos acusa Israel de manter um regime de apartheid

Por Rogerio Magno em 27/04/2021 às 09:50:03
A Human Rights Watch vai deixar de considerar o conflito entre israelenses e palestinos como uma disputa por terras e passa a analisar a situação como um regime único de apartheid. Imagem do assentamento de Ma'ale Efrayim, na Cisjordânia, em 30 de junho de 2020

Oded Balilty/AP

A Human Rigths Watch (HRW), um grupo internacional de defesa de direitos humanos com sede nos Estados Unidos, publicou um relatório nesta terça-feira (27) em que acusa Israel de ter um sistema de apartheid e de perseguição de palestinos tanto no território israelense como nos territórios ocupados.

Israel rejeita essa descrição e afirma que a minoria de árabes no país tem todos os seus direitos civis garantidos (veja mais sobre a resposta de Israel ao relatório abaixo).

Veja uma reportagem de 2020 sobre a retirada, por parte dos palestinos, dos acordos com Israel e com os EUA.

Presidente da Autoridade Palestina diz que cortou relações com Israel e EUA

Gaza é considerada por Israel como um território hostil, já que é governada pelo grupo militante Hamas. Já a Cisjordânia é tida como um território em disputa, que pode ser objeto de negociações de paz.

Com esse relatório de mais de 200 páginas, a HRW deixa de considerar o conflito uma disputa por terras. Para entidade, trata-se de um regime único no qual os palestinos têm direitos básicos negados.

Mulheres palestinas esperam para atravessar a divisa entre as cidades de Ramallah e Jerusalém para poderem ir a uma cerimônia religiosa em uma mesquita, em 16 de abril de 2021

Nasser Nasser/AP

A HRW usou a definição de regime de apartheid e perseguição do Tribunal Penal Internacional. No mês passado, essa corte começou uma investigação sobre os possíveis crimes de guerra cometidos por Israel. O país considera que o tribunal é enviesado, e rejeita a iniciativa.

Para demonstrar seu ponto, a entidade de defesa dos direitos humanos aponta, o relatório, declarações públicas de autoridades de Israel e políticas oficiais do país.

A organização argumenta que Israel "demonstrou a intenção de manter a dominação que os judeus israelenses exercem sobre os palestinos" em Israel, na Cisjordânia e em Gaza. O relatório também cita opressão sistemática e atos desumanos.

Com esses três elementos juntos, ocorre o crime de apartheid, diz o documento.

Palestinos atravessam uma cerca que divide a Cisjordânia de Israel, em 6 de setembro de 2020

Oded Balilty/AP

A respeito da acusação de perseguição, o grupo citou "abusos graves" nos territórios ocupados, incluindo confisco de terras, a negação de alvarás de construção, demolição de casas e restrições de movimento e direitos humanos básicos durante décadas.

O relatório cita algumas políticas que garantem que haja uma maioria judia em Israel e nas terras que pretende manter, ao mesmo tempo em que confina os palestinos a alguns enclaves separados entre si que podem ser controlados pelos israelenses.

A entidade ainda aponta que há políticas que incentivam os palestinos a sair de suas casas. Essas políticas são mais severas nos territórios ocupados, mas, segundo a HRW, mas também são praticadas em Israel. Os cidadãos palestinos são cerca de 20% da população, e são discriminados em áreas como habitação, acesso à terra e serviços básicos.

Omar Shakir, o autor do relatório, disse que desde o começo do processo de paz, na década de 1990, até os anos de Barack Obama na presidência dos EUA, “havia [evidências] o suficiente para questionar se havia uma intenção de dominação permanente”.

Mas muitos dizem que não se pode mais interpretar a situação como temporária devido a alguns fatos:

O fim do processo de paz;

Os planos de Israel de anexar até um terço da Cisjordânia, que foram suspensos, mas nunca abandonados;

A expansão de assentamentos de colonos israelenses;

A aprovação de uma lei de Estado-nação favorecendo os judeus.

“Por anos, vozes proeminentes advertiram que a conduta israelense corria o risco de se transformar em apartheid; este relatório de 213 páginas descobre que o limite foi ultrapassado”, disse Shakir.

Policiais de fronteira de Israel e palestinos, durante protesto contra o aumento de um assentamento na Cisjordânia, em 3 de dezembro de 2020

Majdi Mohammed/AP

Resposta de Israel

Israel rejeita o relatório. O Ministério de Relações Internacionais afirma que sabe-se que a Human Rights Watch tem objetivos anti-Israel há muito tempo. “As alegações fictícias que HRW inventou são absurdas e falsas”, afirmou.

Os defensores de Israel rejeitam as alegação de que haja apartheid. Eles citam a existência da Autoridade Palestina, reconhecida internacionalmente, que administra enclaves espalhados na Cisjordânia, desde a década de 1990.

Israel e os palestinos organizaram várias rodadas de negociações de paz desde então, que incluíram discussões sobre a independência palestina, mas não houve um acordo final.

Eugene Kontorovich, diretor de direito internacional do Kohelet Policy Forum, um centro de estudos conservador israelense, disse que os palestinos são responsáveis ??por seu destino. “Eles escolheram rejeitando alternativas”, disse ele.

A HRW e outros grupos de direitos humanos dizem que, apesar da existência da Autoridade Palestina, Israel mantém o controle sobre quase todos os aspectos da vida palestina, tanto na Cisjordânia quanto em Gaza.

Israel tem controle de 60% da Cisjordânia, suas fronteiras e espaço aéreo, e impõe restrições ao movimento e à residência.

Há quase 500 mil colonos judeus na Cisjordânia que têm plena cidadania israelense, enquanto os 2,5 milhões de palestinos do território vivem sob regime militar.

A disparidade foi observada na campanha de vacinação contra o coronavírus em Israel: os colonos foram vacinados, mas grande parte de seus vizinhos palestinos não recebeu dose nenhuma.

Em Gaza, Israel impôs um bloqueio depois que o Hamas tomou o poder. Israel impõe restrições ao movimento de pessoas e mercadorias dentro e fora de Gaza, assim como o vizinho Egito. Assim, confinou parte de 2 milhões de palestinos à faixa costeira e dizimou a economia.

Os acordos da década de 1990 deveriam ser temporários, enquanto se negocia um entendimento de paz que estabeleceria um estado palestino na maior parte da Cisjordânia, Gaza e Jerusalém oriental, territórios que Israel capturou na guerra de 1967. Mas esse tipo de acordo parece mais fora de alcance do que em qualquer momento nas últimas três décadas.

Israel é dominada por partidos de direita que se opõem à criação de um Estado palestino. Nenhum dos governos palestinos na Cisjordânia ou em Gaza comanda um movimento nacional que pudesse fazer grandes concessões, mesmo que Israel estivesse disposto a fazer o mesmo.

Muitos concluíram que uma solução negociada de dois Estados —ainda vista internacionalmente como a única forma de resolver o conflito— nunca acontecerá.

Em vez de discutir mapas e fronteiras, eles pedem direitos iguais para judeus e palestinos em um Estado binacional ou uma confederação.

Kontorovich, expressando uma crítica israelense comum, acusou a HRW de apontar Israel injustamente e tentar deslegitimar o país.

“Por que dizer que é apartheid? Por que não apenas dizer que Israel tem algumas políticas discriminatórias das quais não gostamos?” ele questiona, retoricamente. A resposta, afirma ele, é que políticas podem ser alteradas, mas um regime de apartheid precisa ser substituído.

A HRW não diz como deveria ser um acordo final, mas afirma que qualquer tentativa de resolver o conflito deve reconhecer a realidade no terreno.

“A questão subjacente é a repressão estrutural e a discriminação”, disse Shakir. “É preciso abordar o abuso de direitos e, em seguida, criar um contexto no qual possa haver uma solução política que todas as partes possam alcançar”, diz ele.

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Fonte: G1

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