Investigação acusa policial penal de negociar com facção criminosa

Por Rogerio Magno em 10/12/2023 às 03:43:53
Foto: Divulgação

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Investigação da Divisão Especializada em Combate ao Crime aponta que as operações contra organizações criminosas no RN estavam sob risco em razão da participação de um agente duplo. Um ex-policial penal e membro do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público, estaria, de acordo com denúncia à Justiça, tentando vender informações de operações policiais e investigações e até suspeita de venda de itens do inventário da Segurança Pública potiguar para terceiros. Trata-se de Dhayme Araújo da Silva, 43 anos, que era considerado um dos policiais penais mais experientes do quadro do Rio Grande do Norte, com reconhecimento dos colegas e cursos no Ministério da Justiça, e Segurança Pública, Departamento Penitenciário Nacional (Depen).

Ele foi denunciado pelos crimes de corrupção passiva, violação de sigilo funcional e receptação e atualmente se encontra preso. Todas essas informações constam em autos policiais e denúncias do Ministério Público do RN à Justiça, obtidas pela TRIBUNA DO NORTE. A defesa do policial penal foi procurada pela reportagem, mas preferiu não se manifestar. Segundo depoimento à Polícia Civil, Dhayme Araújo da Silva se declarou inocente em relação às acusações e afirmou que gostaria de colaborar com as investigações.

As primeiras suspeitas em relação ao agente seriam de que ele teria criado perfis falsos em uma rede social para entrar em contato com advogados ligados a uma facção criminosa. Entre os contatos feitos, o policial penal teria se oferecido para ser um "agente secreto" de uma advogada, além de solicitar dinheiro em troca de informações sigilosas para uma outra advogada, esta investigada numa operação do MP, apontada como uma espécie de coordenadora da "Sintonia dos Gravatas" – uma espécie de departamento das facções criminosas, formado por advogados que colaboram com o crime – sendo posteriormente condenada por integrar organização criminosa.

Com a quebra dos sigilo telefônico, a polícia concluiu, ainda de acordo com a documentação anexada ao processo judicial, que as mensagens disparadas pelo perfil fake tiveram origem da residência do investigado e do prédio do Gaeco, onde ele trabalhava. Além disso, em contato com a operadora de internet, segundo o relatório da polícia, concluiu-se que o sinal de internet era vinculado à conta do policial penal.

Entre as mensagens investigadas pela polícia, surgem falas e conversas relativas a informações "úteis de clientes e de investigações" e a possibilidade de se conseguir nomes, endereços, lotação e telefones de agentes públicos potiguares. Segundo as investigações, o policial penal fala reforça que a situação pode ir adiante caso seja negociado um valor para avançar nas tratativas. O agente também teria se mostrado disposto a transmitir informações sigilosas de clientes dessas advogadas que estão presos em unidades estaduais e federais.

Outra das mensagens que chamaram a atenção da Polícia Civil e do Gaeco foi com relação a uma investigação de um empresário potiguar do ramo de supermercados suspeito de sonegar R$ 180 milhões. A PCRN investigou que o agente público teria tido acesso a informações sigilosas sobre a Operação Logro e feito contato com uma mulher ligada ao empresário dois dias antes da deflagração da operação, "possibilitando assim a fuga do investigado, o que efetivamente ocorreu, ficando alguns dias foragido até obter decisão judicial em seu favor", diz denúncia.

Defesa

Em um depoimento dado à Polícia Civil, o agente disse que era inocente das acusações em seu desfavor e que desejava colaborar com as investigações. O investigado confessou ter mantido tratativas com algumas pessoas, com intuito de obter informações sigilosas, mas não disse quem seriam essas pessoas. Ele disse ainda que fez cursos em vários órgãos vinculados às forças de segurança do Brasil e que não agiu pensando em fornecer informações de endereços de agentes públicos tampouco vazar andamento de investigações ou operações sigilosas.

A Polícia Civil do RN, por meio da Divisão Especializada em Combate ao Crime, tem investigado o policial penal desde o primeiro semestre deste ano. O agente estava cedido ao Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) há dois anos e não atuava junto à Secretaria de Estado da Administração Penitenciária (Seap) há cinco anos, segundo informações apuradas junto à pasta. O agente foi preso numa operação da PCRN no último dia 18 de outubro e teve prisão pela Justiça.

Currículo

O currículo do agente conta com cursos de paraquedismo, intervenções em penitenciárias, colaborações com a Força de Segurança Nacional e assessoria para a Secretaria de Administração Penitenciária Ressocialização do Ceará, após convite do ex-secretário da pasta no RN, Luiz Mauro Albuquerque. Em seu depoimento à polícia, Dhayme disse que na época em que foi coordenador de administração penitenciária do RN (Coape) chegou a apurar quase 30 demissões de policiais acusados de infrações graves no sistema penal.

Servidor processou Estado após ser baleado

O policial preso na operação da Deicor chegou a ser nomeado Coordenador da Administração Penitenciária do Estado (Coape) em 2017. Numa noite em março de 2019, o agente chegou a ser baleado com três tiros de fuzil enquanto fazia uma ronda externa no Complexo Penitenciário de Alcaçuz, em Nísia Floresta, na região metropolitana de Natal. Outro agente penitenciário também ficou ferido, de raspão.

À época, a administração penitenciária do Rio Grande do Norte informou que o coordenador foi ferido por "disparo acidental de arma de fogo". Ele foi foi atingido por tiros de raspão e pelo menos um que transfixou o colete à prova de balas e o atingiu no abdome.

Segundo relato que consta no processo judicial, o agente atuava como coordenador da Coape e fazia uma fiscalização externa no Complexo de Alcaçuz "em virtude de várias denúncias apontarem tentativas de resgate de presos em Alcaçuz, possibilidade de rebeliões e ações das facções criminosas".

"O Requerente foi atingido, em atividade, por vários disparos de fuzil 556 efetuados de forma imprudente por outro agente penitenciário de sua equipe que fazia a ronda no interior da viatura, o que culminou com sua internação com risco de morte, tendo inclusive se submetido a vários procedimentos cirúrgicos em decorrência das graves lesões sofridas", relata. O Estado chegou a recorrer da sentença, mas perdeu a causa no Pleno do TJ. O ganho da ação foi de quase R$ 53 mil por danos morais e materiais, acrescidos de juros e multa, segundo acórdão assinado em 24 de maio de 2023.

Defesa pede Habeas Corpus e transferência

A defesa de Dhayme Araújo da Silva entrou com um pedido de Habeas Corpus na Justiça do RN solicitando a transferência do agente da Cadeia Pública de Ceará-Mirim para o Quartel do Comando Geral da Polícia Militar do Rio Grande do Norte.

"Determino à Secretaria que, em cumprimento à parte final da decisão liminar proferida pelo TJRN em habeas corpus impetrado pela defesa, sejam tomadas as providências para que o réu seja transferido da Cadeia Pública de Ceará Mirim/RN para o Quartel do Comando Geral da Polícia Militar do Rio Grande do Norte", diz decisão do dia 29 de novembro.

Fonte: Tribuna do Norte

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