Crítica: com "Maligno", James Wan explora novas formas de nos aterrorizar

Por Rogerio Magno em 09/09/2021 às 12:37:23

Na trama, Madison (Annabelle Wallis, de "Annabelle" e "Peaky Blinders") sofre com visões assassinatos brutais, e seu tormento piora quando ela descobre que esses pesadelos são realidade e estão ligados ao seu passado. Aparentemente, os crimes estão sendo cometidos por Gabriel, uma espécie de amigo imaginário da infância de Madison despertado por experiências traumáticas do presente, em especial seu relacionamento abusivo com seu marido, Derek (Jake Abel da série "Supernatural").

Para ajudar a entender qual a natureza do retorno de Gabriel, Madison conta com a ajuda da sua irmã, Sydney  (Maddie Hasson, de "Mr. Mercedes") e dos policiais Kekoa Shaw (George Young, da série "Containment") e Regina Moss (Michole Briana White de "Dead to Me"). Por cima, o enredo lembra "Os Olhos de Sarah Mars", uma espécie de giallo norte-americano, dirigido por Irvin Kershner ("O Império Contra-Ataca") e com roteiro de John Carpenter ("Halloween"). O filme foi até citado pelo próprio Wan como uma das suas referências, mas tirando o fato de a protagonista ter visões dos assassinatos, e eles estarem relacionados a questões pessoais dela, as semelhanças param por aí.

Desde que anunciou "Maligno" e divulgou as primeiras imagens, Wan vem afirmando em entrevistas que o longa é “a sua versão” de um giallo. O subgênero, nascido na Itália, é reconhecido pelos seus elementos estéticos – especialmente no uso das cores/sombras, bastante exploração sexual da mulher e volumes excessivos de sangue – e trama de horror psicológico, sempre com um assassino em série e um detetive em seu encalço. A reinterpretação de Wan usa essa base e mistura com um pouco de tudo que ele já fez no cinema, mantendo a violência (estilo "Jogos Mortais"), pitadas de “jump scare” (bem poucos mesmo), a anulação do elemento sexual (como tem sido regra em Hollywood hoje) e com o elemento sobrenatural muito sutil, e quase que trocado por um argumento pseudocientífico mais próximo dos filmes baseados em quadrinhos.

Annabelle como Madison em 'Maligno'. Imagem: Warner Bros Pictures/Divulgação
Annabelle como Madison em uma das suas visões aterradoras em "Maligno". Imagem: Warner Bros Pictures/Divulgação

"Maligno" é James Wan legitimamente tentando navegar por um terreno novo – e conseguindo com a competência que lhe é característica. O filme traz uma propriedade intelectual totalmente nova, construída no roteiro de Akela Cooper ("M3GAN" e o recentemente anunciado "A Freira 2"), a partir do argumento original de do próprio Wan e de Ingrid Bisu (que também tem um papel no filme).

Nessa nova empreitada, Wan trouxe vários de seus parceiros usuais, como o diretor de fotografia Don Burgess e o editor Kirk Morri ("Aquaman" e "Invocação do Mal 2"), além da designer de produção Desma Murphy (direção de arte de "Aquaman", "Velozes & Furiosos 7") e a figurinista Lisa Norcia ("Sobrenatural: A Última Chave"). A trilha é do músico Joseph Bishara, compositor de todos os sete filmes do universo "Invocação do Mal" – e também dublê dos demônios desses filmes. Em "Maligno", Bishara combina os violinos que são sua marca registrada aos sintetizadores típicos dos giallo dos anos 1980, trazendo uma atmosfera perturbadora e nostálgica ao mesmo tempo.

Wan já declarou em entrevista que "Maligno" é um “filme de terror para fãs de filmes de terror”, e um projeto que ele sempre quis tornar realidade. Esse apreço pode ser percebido na construção do roteiro, que pode até começar previsível, mas vai ganhando virada após virada do meio para o final. Também na escolha por usar efeitos visuais práticos sempre que possível, embora a computação gráfica também seja usada em larga escala, mas para outros tipos de efeitos que não somente o gore em si (chega de sangue feito em computador, por favor).

James Wan no set de 'Maligno'
Diretor, produtor e roteirista James Wan no set de "Maligno". Imagem: Warner Bros Pictures/Divulgação

O maior beneficiário dessa decisão é o vilão Gabriel, um dos mais originais do cinema recente de horror. Caracterização, figurino e especialmente o trabalho corporal e de movimentação foram pensados para fazer do antagonista de "Maligno" uma figura icônica para o gênero – e a fonte de, quem sabe, uma nova franquia com o “selo James Wan” de qualidade. Gabriel é um vilão moldado para as novas gerações, cada vez mais habituadas a super-heróis (e supervilões) nas telonas.

Como um giallo com uma roupagem moderna e com um serial killer superpoderoso, "Maligno" usa litros e litros de sangue para debater se laços sanguíneos são mais fortes do que outros tipos de relação que construímos ao longo da vida. Como as pessoas próximas a nós podem nos afastar das coisas que são verdadeiramente importantes, e como podem nos ajudar a superar traumas de modo que o parente mais “chegado” não faria – ou até seria a causa disso.

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Mais criativo do que nunca, Wan usa e abusa de ângulos de câmera e montagens que ele vem desenvolvendo ao longo de sua carreira, muitas delas derivadas não das suas produções de horror, mas dos blockbusters que vem se gabaritando a fazer nos últimos anos. A história dá seus tropeços no meio, enquanto ainda estamos tentando entender qual a origem do mal e sua relação com a protagonista, mas tudo vale a pena quando chega o terceiro ato de "Maligno", uma explosão de horror e violência poucas vezes vista nos cinemas.

Não só um “filme de terror para fãs de filmes de terror”, "Maligno" também é um “filme do James Wan para fãs do James Wan”, que vem acompanhando seus trabalhos como diretor, produtor e criador de universos.

Fonte: Olhar Digital

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