Veja o que dizem os presidentes latino-americanos flagrados com empresas em paraísos fiscais

Por Rogerio Magno em 09/10/2021 às 10:35:34

A relação do ex-banqueiro com paraísos fiscais é antiga. Reportagens investigativas de 2017 já apontavam que ele estava vinculado à criação de 49 companhias ocultas. Entre 1999 e 2000, Lasso aumentou sua fortuna declarada de US$ 1 milhão para US$ 31 milhões (cerca de R$ 167 milhões).

Chile

O presidente chileno Sebastián Piñera, que deixará o cargo neste ano, também aparece no Pandora Papers.

Piñera teria vendido suas ações do projeto mineiro Dominga, em 2010, numa operação de US$ 138 milhões (cerca de R$ 745 milhões). O valor total foi pago em quatro parcelas nas Ilhas Virgens Britânicas, sendo que o último depósito estaria condicionado à suspensão do título de unidade de preservação ambiental na zona onde a mineradora pretendia extrair cobre e ferro.

O caso da venda das ações do projeto mineiro Dominga já tinha vindo à tona em 2017, mas foi encerrado por falta de provas. As ações vendidas estavam registradas no nome dos filhos do presidente, portanto a defesa alegou que o chefe de Estado nunca foi informado sobre a operação.

No entanto, quatros anos depois da venda, o Serviço de Avaliação Ambiental mudou sua decisão sobre a área de preservação, dando luz verde para o projeto Dominga, na região de Coquimbo, norte do país.

O Ministério Público anunciou que irá investigar se houve delito tributário, tráfico de influência ou negociação incompatível de Piñera durante sua gestão presidencial.

Em comunicado, a assessoria do presidente chileno assegura que há 12 anos ele não é proprietário de qualquer empresa offshore e que desde 2018 seus bens são geridos por administradoras de fundos, “o que implica que o mandatário não conheça os investimentos realizados.”

Em 2017, Piñera declarou possuir um patrimônio de US$ 2,7 bilhões (cerca de R$ 14 bilhões).

“Com tanto dinheiro, por que essas pessoas vem governar um Estado? Se dizem que é algo tão penoso, sacrificante ser funcionário público. É certo que tem algum tipo de interesse. Então se eles estão ocupando esses postos no Estado é porque tem algum tipo de privilégio ou acesso a informações privilegiadas que vão ajudar nos seus negócios”, defende a cientista política Ana Prestes.


Depois do Panamá Papers, em 2014, o Pandora Papers seria a maior investigação jornalística sobre empresas offshore / Loic Venance / AFP

República Dominicana

O presidente Luis Abinader foi apontado como sócio de duas empresas panamenhas (Littlecot Inc. e Padreso SA), criadas antes de que ele assumisse o mais importante cargo do Executivo do país.

Assim como seu homólogo chileno, Abinader declara não saber detalhes sobre seus investimentos, que seriam administrados por terceiros desde 2020, quando decidiu concorrer à presidência. “São consultores que contratamos para comprar empresas nessa jurisdição. Serve para facilitar transações comerciais com clientes e reduzir travas administrativas”, declarou.

O opositor Partido da Liberação Dominicana (PLD) acusa o presidente de “sequestrar os organismos de controle” e diz que ele “desconhece a transparência”, destacando que as duas empresas panamenhas não aparecem na declaração jurada de bens do mandatário. O PLD tenta abrir uma investigação no Parlamento, mas precisa da maioria qualificada para levar adiante um processo contra Abinader, que possui a maioria das 32 cadeiras.


A vice-presidenta da Colômbia, Martha Lucía Ramirez, indicada no caso Pandora Papers, também já teve familiares condenados por crimes de narcotráfico / Presidencia Colômbia

Colômbia

A vice-presidenta colombiana, Marta Lucía Ramírez, assim como a ministra de Transporte, Ángela María Orozco, e o chefe da Direção de Impostos e Aduanas Nacionais (Dian), Lisandro Junco Riveira, são mencionadas na investigação jornalística.

Ramírez e seus familiares figuram como sócios da Global Securities Management Corporation, nas Ilhas Virgens Britânicas. O fundador da empresa, Gustavo Hernández Frieri, foi preso em 2021 por lavagem de dinheiro que havia sido desviado da Petróleos de Venezuela S.A (Pdvsa). A vice-presidenta disse que não pode ser implicada no caso, porque vendeu suas ações em 2018.

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A ministra de Transporte aparece como sócia da mesma corporação, mas afirma que vendeu sua parte em 2012.

Já o diretor da DIAN possui empresas offshore ativas nos Estados Unidos, com uma conta no Citibank de Miami com cerca de US$ 10 mil (R$ 54 mil). Riveira afirmou que a empresa se tratava de uma operação familiar que não se concretizou e que a sociedade segue ativa como forma de poupança para ele e sua esposa.

O presidente Iván Duque respondeu ao caso dizendo que não é um delito possuir contas no exterior desde que estejam declaradas.

No total, 588 colombianos estão relacionados com os Pandora Papers, incluindo os dois ex-presidentes César Gaviria (1990-1994) e Andrés Pastrana (1998 -2002).

De acordo com levantamentos independentes, a Colômbia deixa de arrecadar anualmente cerca de US$11,7 bilhões (aproximadamente R$ 63 bilhões), equivalente a 18% da receita tributária, por evasão fiscal de grandes empresários.


As Ilhas Virgens Britânicas são consideradas um dos principais paraísos fiscais do mundo, possuem apenas 152km² e 400 mil empresas registradas, recebendo cerca de US$ 60 bilhões anualmente / Reprodução / Youtube

Negócio transnacional

A lista de ex-presidentes latino-americanos citados na investigação ainda inclui três ex-chefes de Estado do Panamá, dois de El Salvador, o hondurenho Porfirio Lobo Sosa, o paraguaio Horacio Cartes e o peruano Pedro Pablo Kuczynski.

Segundo a rede Tax Justice, cerca de US$ 427 bilhões (R$ 2,3 trilhões) foram perdidos em 2020 pela evasão fiscal de grandes empresários. Somente no Brasil, a cifra estimada é de US$14,9 bilhões (cerca de R$ 80 bilhões).

A Oxfam também indica que 9 a cada 10 empresas da lista das 200 maiores multinacionais do mundo possuem contas em paraísos fiscais. Em 2015, os 20 maiores bancos europeus declaram possuir cerca de 25% dos seus fundos em territórios livres de impostos.

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Para a cientista política Ana Prestes, a ascensão de governos conservadores através de golpes de Estado, perseguição político-judicial e instrumentalização dos organismos internacionais, como a Organização dos Estados Americanos (OEA), fazem parte de uma articulação internacional entre personagens políticos e empresários.

“Foi uma elite econômica neoliberal, associada às oligarquias vigentes no nosso continente, aliadas ao imperialismo, que começaram a recuperar seus postos no mando do Estado. Isso mostra como a integração latino-americana é necessária, inclusive para criar mecanismos de controle do capital externo na nossa região para proteção das nossas populações”, conclui Prestes.

Fonte: Brasil de Fato

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