A votação de 1988 foi marcada por um anúncio considerado racista que acusava o candidato democrata, Michael Dukakis, de ser suave no combate ao crime. O vídeo foi veiculado por um grupo dissociados da campanha oficial, mas que faz publicidade para um dos candidatos. A partir de então, esse tipo de organização passou a fazer a parte mais agressiva da campanha nos EUA. Eleições Históricas nos EUA: George H. Bush x Michael Dukakis
O candidato do Partido Democrata à presidência dos EUA em 1988, Michael Dukakis, chegou a ter 17 pontos de vantagem em relação ao seu oponente naquele ano, o republicano George Bush.
Dukakis havia sido o governador do estado do Massachusetts. Nas primárias, ele venceu alguns adversários importantes, como Al Gore, que depois seria vice-presidente, Joe Biden, que concorreu nas prévias pela primeira vez em 1988, e Jesse Jackson, o primeiro político negro com chances reais de ser candidato à presidência dos EUA --esse último teve um papel importante mais à frente nas eleições.
O G1 publica esta semana uma série de reportagens sobre eleições presidenciais americanas marcantes e como elas mudaram o cenário político no país. Leia também:
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Durante seu tempo como governador, Dukakis implementou uma política de progressão de pena para os detentos de Massachusetts. A ideia era dar incentivos aos prisioneiros que cumpriam pena perpétua para que eles tivessem bom comportamento dentro das cadeias.
Imagem sem data do político Michael Dukakis
Divulgação/Biblioteca do Congresso dos EUA
A política custou as eleições daquele ano e foi importante não só para a vitória de Bush, mas também para estabelecer uma tática de ataque em política: a ação de grupos de interesse que não são diretamente ligados à campanha.
A campanha de Bush de 1988 marca o nascimento da campanha negativa moderna, de acordo com uma reportagem deste ano do "The New York Times": "Os republicanos marcaram Dukakis, então o governador de Massachusetts, com o caso de Willie Horton, um afro-americano que havia estuprado uma mulher de Maryland e esfaqueado seu namorado quando estava em uma saída temporária".
O crime de Willie Horton
Reprodução do vídeo político sobre Willie Horton, que marcou as eleições de 1988
Reprodução
Em 1974, no estado de Massachusetts, três homens mataram um frentista de posto de gasolina quando iam cometer um assalto. A vítima tinha 17 anos, foi esfaqueada 19 vezes e seu corpo foi jogado em um container de lixo.
Um dos três era Willie Horton, que foi preso e condenado à prisão perpétua.
Em 1986, graças à política de progressão de pena de Dukakis, Horton ganhou o direito de sair da prisão por 48 horas sem monitoramento. O condenado fugiu e ficou um ano na lista dos dez criminosos mais procurados dos EUA. Em 1987, foi capturado depois de invadir a casa de um casal de Washington DC. Ele amordaçou o rapaz e estuprou a mulher.
Os crimes tiveram muita repercussão na mídia local.
Susan Estrich, a gerente da campanha do democrata Michael Dukakis, deu uma entrevista sobre o caso em 2016. "No minuto em que ganhamos a nomeação [do Partido Democrata] sabíamos que enfrentaríamos o caso Willie Horton".
Michael Dukakis não só havia implementado a política de progressão de pena em seu estado, ele também era um político contrário à pena de morte.
Bush se mostrava como um candidato duro com o crime, mas atacar Dukakis com esse caso seria visto como um exagero pelo eleitorado.
O PAC entra em cena
Nos EUA, grupos podem se organizar para fazer campanha por uma pauta política e apoiar um candidato sem estarem diretamente vinculados a um partido. Não só isso, eles conseguem captar dinheiro com menos restrições que os próprios partidos.
Esses movimentos são conhecidos como PACs (sigla para Comitês de Ação Política em inglês).
Foi o PAC Segurança Nacional que trouxe o caso de Willie Horton à tona durante a campanha de 1988. O resultado foi tão bem-sucedido que nas eleições seguintes, os ataques mais agressivos entre adversários políticos passaram a ser feitos por PACs, e não pelas campanhas dos próprios candidatos.
O anúncio que o PAC Segurança Nacional passou a veicular é considerado um dos mais marcantes na história da política dos EUA.
No vídeo de 30 segundos, eles citam que Bush é a favor da pena de morte, e Dukakis, contra e, então, dizem que o democrata permitiu que presos saíssem da prisão por um fim de semana.
"Um deles foi Willie Horton, que matou um garoto durante um roubo e o esfaqueou 19 vezes. Apesar de uma pena de prisão perpétua, Horton recebeu autorização para sair da prisão por fins de semana em 10 ocasiões. Ele fugiu, sequestrou um casal, esfaqueou o homem e estuprou repetidamente a namorada."
Mensagem indireta
"A campanha usou estereótipos raciais que já vinham sendo reproduzidos na cultura dos EUA para mobilizar os eleitores brancos nos EUA, um estereótipo que os homens negros são propensos a crimes e estuprar mulheres brancas", diz Márcio Nunes de Abreu, mestre em Cultura e Sociedade pela Universidade Federal da Bahia.
Ele apresentou um trabalho na universidade sobre a representação dos negros nas campanhas eleitorais dos EUA.
Em 1988, as prévias democratas tiveram pela primeira vez a participação de um pré-candidato negro competitivo, o reverendo Jesse Jackson.
Quando o vídeo publicitário sobre Willie Horton surge durante a campanha, Jackson foi o primeiro a falar do caso, diz Abreu. "A tática subliminar é dizer ao eleitoral branco que, se Michael Dukakis for eleito, os EUA serão invadidos por homens negros selvagens soltos estuprando mulheres brancas", disse o reverendo.
Depois que Jackson vem a público para fazer esses comentários, afirma Abreu, o tema do racismo passa a aparecer nas pautas jornalísticas das eleições, e Bush chega a diminuir as mensagens a respeito, mas mantém a vantagem eleitoral.
Se a sua mulher fosse estuprada e assassinada
Dukakis enfrentou essa polêmica de uma forma indireta em um debate. Um dos entrevistadores fez a seguinte pergunta: "Governador, se Kitty Dukakis (a mulher de Michael) fosse estuprada e assassinada, o senhor apoiaria a pena capital para o assassino?".
O candidato democrata respondeu que não: "Eu me opus à pena capital durante minha vida toda, não vejo nenhuma evidência de que é um impeditivo [a mais crimes]", acho que há formas melhores e mais efetivas de lidar com crimes violentos".
A fala dele não mencionou a formulação mais chamativa da pergunta, que envolvia sua própria mulher.
Vitória em 40 estados
George H. W. Bush toma posse em 1989
Divulgação/Biblioteca do Congresso dos EUA
A vitória foi marcante: os republicanos venceram em 40 estados, com uma margem de 53% contra 46% do total dos eleitores.
Bush, no entanto, não iria conseguir repetir o desempenho quatro anos depois. Ele foi derrotado pelo democrata Bill Clinton, com sua campanha focada em um slogan "É a economia, tonto".
